Andre Lazaroni

quarta-feira, junho 02, 2010


O engenheiro agrônomo Tony Jarbas Ferreira de Cunha, pesquisador da Embrapa Semiárido, afirmou, em Recife, que um dos grandes desafios para a recuperação da mata ciliar do rio São Francisco é – sem trocadilho - conciliar a produção agrícola, que garante alimento às famílias ribeirinhas e renda aos empreendimentos privados, e o envolvimento ativo desses segmentos no processo de reconstituição da vegetação da beira do rio e dos seus afluentes. Em recente relatório parcial do projeto “Contribuição à revitalização do rio São Francisco com base na reconstituição das suas matas ciliares e recuperação de áreas degradadas nos municípios de Petrolina, Lagoa Grande e Santa Maria da Boa Vista”, o pesquisador faz um amplo levantamento das áreas afetadas pela degradação, identifica a relação que têm com a exploração agrícola e atividades
humanas inadequadas.

Segundo a divulgação da Embrapa Semiárido, trata-se de um volume detalhado de dados, mapas e informações, que esclarece a dimensão que o problema vem tomando nos últimos anos, mas, também, ajuda a população ribeirinha, autoridades e empreendedores a se integrarem em iniciativas para conter práticas de desmatamentos, queimadas e cultivos em locais impróprios. O relatório foi encaminhado ao Banco do Nordeste que financia a execução do projeto coordenado por Tony Jarbas Ferreira de Cunha. Na sua elaboração foram empregadas técnicas de geoprocessamento, imagens de satélites, além da observação in loco nas margens do rio. A paisagem que se sobressai é a gradativa eliminação da vegetação da caatinga, e parte dela sendo
convertida ao processo agrícola.

Nos três municípios pesquisados, o engenheiro agrônomo delimitou as áreas em não degradada e degradada. Esta, ele subdividiu em quatro grupos: antropizadas – considerada a mais importante para as questões relacionadas aos impactos negativos das atividades humanas sobre o rio São Francisco; de influência urbana – as cidades, complexos industriais, aeroportos e vilarejos; cultivos – onde estão os projetos de irrigação e assentamentos rurais; e pastagem natural. Conforme o relatório do projeto, a degradação na zona ripária do rio acontece de forma diferente em cada um dos municípios. Em Petrolina, que tem o quarto maior PIB agrícola do país, as áreas afetadas correspondem a 43.164,04 (29%) do total de 146.398.22 hectares das margens do Rio São Francisco.

Também em Petrolina, as maiores extensões de áreas degradadas estão relacionadas aos cultivos – 19.366.51 há – e às áreas antropizadas -17.479.39 ha. Em Lagoa Grande, de um total de 19.013,58 ha de margem de rio, 34,4% (6.549.64 ha) apresentam problemas ambientais, cujas causas mais relevantes são as ações antrópicas (3.182,13 ha) e os cultivos (3.035,08 ha). No caso de Santa Maria da Boa Vista as informações registradas pelo pesquisador Tony Jarbas são as seguintes: a área total de margem é 56.807,71 ha que sofre processos de degradação já em 15.708,2 ha (27,65%). As áreas antropizadas (8.886,30 ha), seguida dos cultivos (6.335,54 ha) são os fatores que mais interferem no ambiente desse município pernambucano. As alterações
provocadas pela expansão urbana são relevantes em Petrolina.

As anotações de degradação referente a esta questão correspondem a 11%. Em Lagoa Grande e Santa Maria, os percentuais são de pouco mais de 0,82% e 1,22%, respectivamente. Para Tony Jarbas, agricultores e autoridades ligadas ao meio ambiente e ao desenvolvimento regional precisam estar atentos a esses percentuais até porque eles revelam situações que vêm acontecendo ao longo do tempo. Em alguns locais, a degradação alcança grau tão elevado que os solos não prestam mais para uso algum e, em parte delas, apenas a algaroba, que é uma espécie exótica, apresenta resistência para suportar a salinização das terras que margeiam o rio. Engenheiro Florestal com atuação na área de Sensoriamento Remoto, o pesquisador Iedo
Bezerra Sá, da Embrapa Semiárido, afirmou que os problemas decorrentes do desmatamento e queimadas da mata ciliar, as práticas agrícolas inadequadas, se estendem por toda a bacia do rio São Francisco.

No estudo “Sedimentação do rio São Francisco: uma abordagem utilizando técnicas de sensoriamento remoto orbital e geoprocessamento” ele aponta “evidentes agressões provocadas ao rio”. Na sua realização, utilizou a série histórica de dados orbitais do sistema de satélite da série Landsat 5-7, entre os anos de 1995 e 2005, e o mosaico de imagens Geocover da NASA, do ano de 2006. Com base nas imagens de última geração associadas a deslocamentos para a verificação no campo das observações realizadas por satélite, Iedo Sá é categórico: em praticamente todos os locais analisados, observa-se intensa atividade agrícola, associada a práticas de manejo inadequadas, queimadas, subtração da vegetação ciliar, loteamentos de
urbanização, parques industriais de alto potencial poluidor, estruturas de laser não regulamentadas e emissão de esgotos sem nenhuma forma tratamento.

Segundo o pesquisador, os sedimentos já são registrados no leito do rio a taxas “altíssimas”. Levantamento feito pela Agência Nacional das Águas, de 2003, os sedimentos na bacia eram assim distribuídos: 8,3 x 106 T/ano no Alto São Francisco, nas imediações de Pirapora (MG); 21,5 x 106 T/ano, no Médio São Francisco, próximo a Morpará (BA); 12,9 x 106 T/ano, no Submédio, nos arredores de Juazeiro (BA); e 0.41 x 106 T/ano, no baixo, nas cercanias de Própria (AL). Para Iedo, é como se fossem despejados no ano milhares de toneladas de terra no leito do rio. No caso de Pirapora, a quantidade de sedimentos anotados pelo estudo da ANA equivale à capacidade de aproximadamente 593 mil caçambas, com disposição para 14 toneladas cada. Nas proximidades de Juazeiro, os números indicam que algo como o carregamento de areia de 921 mil caçambas está indo por ano parar no leito do rio São Francisco.

As quantidades mais elevadas no médio e no submédio se devem à pequena declividade do rio. Em outras palavras, o rio não tem força para empurrar os sedimentos na correnteza. Assim, se precipitam para o fundo dos rios, causam assoreamento, e, em conseqüência, diminuem de vazão, a água perde qualidade, diminuem a navegabilidade e a piscosidade. Para Iedo, a erosão do solo e o conseqüente assoreamento dos cursos d’água são dois dos problemas mais graves. O desmatamento, sobretudo da mata ciliar, para o estabelecimento da agricultura, da pecuária extensiva e retirada de madeira, tem contribuído de forma determinante para a degradação. Assegurou o pesquisador que recompor a vegetação das margens do rio e dos seus afluentes é
fundamental para minimizar os problemas que ocorrem na bacia hidráulica e por extensão em toda a bacia hidrográfica.

Atualmente estão em andamento iniciativas de recuperação da mata ciliar do rio organizadas por diversas instituições públicas e organizações da sociedade civil. Em uma delas, o Escritório de Petrolina da Embrapa Transferência de Tecnologia produziu cerca de 200 mil mudas de espécies nativas para apoiar as ações de revegetação da Codevasf ao longo de 400 km da margem esquerda do rio, entre os municípios pernambucanos de Petrolina e Petrolândia, no Submédio São Francisco. O engenheiro agrônomo Ivan Andre Alvarez, pesquisador da Embrapa Semiárido na área de Manejo e Conservação de Formações Vegetais, considera que um desafio para garantir bons resultados neste trabalho de recuperação de mata ciliar está na abordagem aos proprietários de terras próximas às margens do rio.

A fragmentação das propriedades com uma grande diversidade de usos agrícolas e de lazer aumenta a complexidade do planejamento de ações que reduzam os impactos ambientais sobre a bacia hidrográfica. Para ele, o manejo vegetal precisa estar associado ao uso e às expectativas da população que vive no entorno do rio. No projeto que coordena, “Diagnóstico de áreas degradadas e plano piloto de recuperação das margens do rio São Francisco para o bioma caatinga na região de Petrolina (PE) /Juazeiro (BA)”, Ivan explicou que a questão da mata ciliar é pesquisada no conjunto das estratégias de produção dos agricultores e ribeirinho e é fundamental trabalhar a recuperação florestal aliada ao manejo da propriedade com alternativas que sejam viáveis aos proprietários.

No projeto atua uma equipe de 30 pesquisadores da Embrapa (Semiárido, Floresta e Solos/UEP Recife), das universidades do Vale do São Francisco (Univasf), Federal Rural de Pernambuco (UFRPE, do Estado da Bahia UNEB) e Estadual de Santa Cruz (UESC). Em 16 propriedades, das mais de 100 selecionadas inicialmente, já estão diagnosticadas quanto à cobertura vegetal, qualidade do solo, presença de polinizadores e forma de uso da propriedade. O objetivo é propor um plano piloto para futuras intervenções na paisagem do entorno do rio São Francisco na área da Região Integrada de Desenvolvimento (Ride) formada pelos municípios de Juazeiro, Curaçá, Casa Nova e sobradinho – na margem baiana, e Petrolina, Lagoa Grande, Santa Maria da Boa
Vista e Orocó – do lado pernambucano.

Contatos: Iedo Bezerra Sá – pesquisador; iedo@cpatsa.embrapa.br

Ivan Andre Alvarez – pesquisador; Ivan.alvarez@cpatsa.embrapa.br

Tony Jarbas Ferreira da Cunha – pesquisador; tony@cpatsa.embrapa.br

Marcelino Ribeiro – jornalista; marcelrn@cpatsa.embrapa.br

Embrapa Semiárido – 87 3862 1711.

publicado por André Lazaroni em 2.6.10



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